14 outubro, 2006

Assim fala(va) a Literatura

Antes de mais, saúdo os leitores deste digníssimo blog (stricto sensu, familiares e amigos). Resolvi iniciar a minha contribuição nesta obra, ainda criança, com um tema cultural: a literatura dita light. De facto, nem concordo com a expressão. Já dizia o patrono deste blog (sim, já que foi dele que foi tomado o nome por empréstimo a fundo perdido) “minha pátria é a Língua Portuguesa”. A verdade é que, tendo nós a honra de ter uma língua tão rica e criativa, duvido que não arranjássemos expressão melhor. Tudo parece obedecer ao domínio da raiz saxónica das palavras e dos hábitos. Os hábitos ficarão para outros escritos. Chego a pensar que o termo surgiu por osmose…se para qualquer produto existe uma alternativa light, a literatura, como produto massificado que se tornou, não poderia escapar à pandemia.
Eu chamar-lhe-ia “literatura do imediato” ou de latrina, como preferirem. A verdade é que a sociedade actual se encontra num estádio de preguiça cultural justificado pela correria do dia-a-dia. No entanto, muito me espanta que, apesar da apregoada preguiça, não haja uma crise de vendas nos livros de Margarida Rebelo Pinto ou de Maria João Lopo de Carvalho, por exemplo. Reconheço que a vida nos centros urbanos não facilita nem desperta a vontade de pegar em livros pesados…embora abundem no metro de Lisboa caras tapadas pelo “Anjos e Demónios” de Dan Brown. Não me parece que seja uma questão de peso…
Talvez não seja também uma questão de falta de tempo, mas sim de uma mentalização progressiva de que a cultura, especialmente a literatura, “é chata”. Tudo o que não fale de relações fugazes, de traições, do hotel íbis, torna-se terrivelmente enfadonho.
A venda exponencial de literatura “do imediato” é causa e consequência de um progressivo abaixamento da fasquia, no que diz respeito à qualidade da literatura. Convém esclarecer que não defendo um monopólio dos clássicos ou a leitura exclusiva de obras premiadas, até porque considero que nem sempre aquilo que é reconhecido tem a qualidade que se apregoa. Defendo sim, que a massificação desta leitura vocacionada para os transportes públicos e para as casas de banho prejudica grandemente a capacidade crítica relativamente à forma e ao conteúdo da literatura.
Acredito cada vez mais que ler é conhecer pessoas. Se uma personagem for bem estruturada, facilmente é possível entrar num mundo alternativo no qual efectivamente conhecemos quem nele se move. Aliás, pode até nem ser a personagem que nos leva a uma aproximação de nós próprios, mas sim a forma como o texto é transmitido ao leitor. Serei uma céptica se acreditar que quem escreve um ou mais livros por ano todos os anos não dá o melhor de si aos leitores a menos que se trate de um génio literário? Se assim for, estamos num país em que a produção massiva de génios literários não conhece fim à vista. Valha-nos isso…ao menos que produzamos alguma coisa em massa...talvez assim quando os fundos europeus forem cortados possamos viver de “sopa de letras”.

1 Comentário(s):

Blogger Rita Paias said...

Pois é,cada vez mais os portugueses se dedicam à lei do menor esforço (devem ter gostado muito de economia política, lol). Até na literatura se procuram livros fácis de ler, que não façam pensar muito.
Até quando vamos continuar assim meus senhores?

5:04 da tarde, novembro 04, 2006  

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